Casa de Deus vira templo de adoração à Virginia

A entrada da famosa na igreja vira espetáculo e escancara mazela intelectual de fiéis: quem é digno de adoração em uma Igreja?

 O que vimos na missa em que Virgínia Fonseca apareceu não foi uma celebração da fé. Foi um show de horrores. Um espetáculo constrangedor em que os fiéis deixaram de lado e viram as costas para o altar, o Evangelho, a presença do próprio Cristo, para correr atrás de uma influenciadora como se ela fosse a salvação de suas vidas. A cena, com uma multidão de celulares em punho, fiéis em pé, rodeando a moça como se ela fosse uma aparição celestial é um retrato duro e vergonhoso do que nos tornamos: devotos de ‘deuses’ que não são deuses. Deuses do digital, apóstolos do engajamento, cegos diante do que realmente importa.

É impossível não lembrar da passagem bíblica em que Jesus entra na sinagoga, vê o caos instalado e declara com firmeza: “Minha casa será chamada casa de oração, mas vocês a estão transformando em um covil de ladrões” (Mateus 21:13). Ele vira mesas, repreende os vendilhões do templo e nos ensina que há lugares que devem ser respeitados, independentemente de fama, status ou vaidade. A diferença? Hoje, não foi necessário vender pombas para profanar a casa de Deus. Bastou uma entrada triunfal de uma celebridade para a missa virar conteúdo.

Que fique claro: essa coluna não é sobre Virgínia! Sobre a fé da influenciadora embora ela já soubesse tumulto que iria causar. A quem tem alcance, espera-se discernimento. E se a presença dela causaria tamanha agitação, o mínimo era preservar o espaço. Mas também é, principalmente, sobre nós, como sociedade. Que povo é esse que, diante do altar, larga o terço, a oração, a reflexão, para sacar o celular para gravar uma influencer? Que cultura é essa que transforma qualquer lugar em cenário para stories? Já não há mais linha entre o sagrado e o espetáculo?

Foi triste, foi revoltante, foi grotesco. E isso mostra o nível intelectual da média geral brasileira. Uma missa transformada em gravação de camarim. Uma igreja tomada por gritos abafados, câmeras erguidas, gente disputando espaço para conseguir o melhor ângulo. Enquanto isso, o altar de Cristo, aquele que deveria ser o centro, ficou esquecido. É como se todos dissessem, com seus atos, que o Filho de Deus pode esperar, porque a estrela do momento está ali e precisa ser filmada.

Este episódio precisa nos envergonhar. Precisa nos sacudir. Que sirva de alerta a influenciadores, sim, mas principalmente a cada fiel que esteve ali e a todos nós que assistimos. A Casa do Senhor não é palco, não é camarote, não é estúdio. É lugar de recolhimento, de oração, de silêncio. Quem entra ali com outra intenção — seja para aparecer, seja para filmar — está, ainda que sem perceber, virando as costas para o altar. E isso, meus caros, é blasfêmia disfarçada de likes.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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