A recente declaração de Donald Trump sobre “vigiar o Brasil” é o ápice de uma articulação de meses protagonizada por Eduardo Bolsonaro, que escancara o paradoxo de um nacionalismo que clama por tutela estrangeira
Donald Trump surpreendeu zero pessoas com uma declaração inusitada: afirmou estar “de olho no Brasil”. A frase, curta mas politicamente densa, ecoou entre os apoiadores da extrema direita brasileira como um sinal de alinhamento internacional. O que poucos admitem, no entanto, é que essa fala é fruto de um esforço sistemático, há pelo menos seis meses, liderado por Eduardo Bolsonaro em território americano. O deputado tem atuado como uma espécie de embaixador informal de pautas bolsonaristas nos Estados Unidos, buscando respaldo e legitimação de figuras do Partido Republicano, algo que, paradoxalmente, contraria o próprio ideal que eles dizem defender: a soberania nacional.
O que se presencia é uma manobra que expõe uma das maiores contradições do discurso patriótico da extrema direita brasileira. Como é possível que aqueles que se autoproclamam guardiões da pátria recorram a potências estrangeiras, em especial aos Estados Unidos, para influenciar o debate político interno? O pedido implícito (e por vezes explícito) de tutela norte-americana escancara um nacionalismo superficial, moldado mais por aversões ideológicas do que por um projeto coerente de soberania. A ideia de que um presidente dos EUA deve “vigiar” o Brasil sugere, no fundo, que certos setores da política nacional já não confiam no próprio sistema democrático, a menos que ele produza os resultados que desejam.
Do ponto de vista da ciência política, trata-se de um fenômeno que poderíamos denominar de “patriotismo subordinado”: um tipo de nacionalismo que aceita, e até deseja, a ingerência de potências externas, desde que ela venha para reforçar os seus próprios interesses ideológicos. Tal comportamento rompe com os paradigmas clássicos do patriotismo, que têm como pedra angular a autonomia e a autodeterminação dos povos. Em vez disso, assistimos a uma inversão de valores: quanto mais forte o vínculo com o estrangeiro alinhado ideologicamente, mais os “patriotas” se sentem fortalecidos, ainda que isso custe a própria independência simbólica do país.
É preciso refletir sobre os efeitos políticos dessa postura. Quando representantes eleitos abrem mão da construção de alianças internas para buscar validação em Washington, enviam à sociedade brasileira uma mensagem perigosa: a de que nossa democracia não se resolve em casa, mas no exterior. A fala de Trump, portanto, não é um gesto isolado: é o resultado de um esforço político que mobiliza afetos antidemocráticos, coloca em xeque a soberania e deslegitima as instituições brasileiras. Tudo isso sob o disfarce de um patriotismo que, na prática, se ajoelha diante da bandeira alheia em nome de interesses familiares. Quer uma prova? Bolsonaro não quer mais ver, nem pintada de ouro, Carla Zembelli. Tá enrolada? Cada um por si, não se aproxime de minha imagem.
No fim, resta a pergunta incômoda: que patriotismo é esse que só se sente seguro sob a sombra de uma potência estrangeira? É justamente quando figuras como Eduardo Bolsonaro clamam por atenção americana que entendemos o real conteúdo desse “amor à pátria”. Não é patriotismo: é dependência ideológica desde a época em que vendia hamburguer nos EUA. E, basta uma conversa com poucos cientistas políticas sérios e vem a conclusão: é impossível não registrar a ironia: quanto mais esses grupos dizem amar o Brasil, mais parecem dispostos a entregá-lo. Claro, desde que escapem de suas penas.
