O visto que não vê mais o brasileiro

Com a nova taxa americana, o acesso ao visto de turismo se afasta da realidade da maioria dos brasileiros e escancara desigualdades históricas nas relações internacionais

Viajar para os Estados Unidos, que já era um privilégio para poucos, acaba de se tornar ainda mais inacessível para o brasileiro médio. A nova cobrança de US$ 250, batizada de Visa Integrity Fee, aprovada pelo Congresso americano e sancionada por Donald Trump, eleva o custo total do visto de turismo para impressionantes US$ 459, o equivalente a mais de R$ 2.500. Isso sem contar os custos com deslocamento até os consulados, documentação e tempo de espera. Na prática, o que se configura é um novo filtro social: quem pode pagar, entra; quem não pode, volta sonhar de longe.

Não se trata apenas de uma questão econômica, mas de um recado político. Ao tornar mais caro o acesso ao visto, os Estados Unidos, sempre tão preocupados com a retórica da liberdade e da mobilidade, sinalizam que essa liberdade não vale para todos. O país que lutou para globalizar o mundo agora teme sua própria globalização. E com isso, o brasileiro que deseja conhecer Nova York, fazer um curso, visitar a Disney com os filhos ou até mesmo fazer compras em Miami está sendo dissuadido com cifrões. E o mais grave: isso vem sendo feito sem diálogo, sem consideração pelas relações diplomáticas e sem pensar nas consequências culturais e emocionais de um país historicamente conectado à cultura americana.

O impacto disso atinge não só o turista eventual, mas toda uma cadeia de prestadores de serviço: agências, escolas de intercâmbio, tradutores, despachantes, profissionais do turismo, esporte, e por aí vai… A nova taxa pode provocar uma retração nesse setor, que já sofre com o câmbio desfavorável. E mais: reforça uma ideia muito perigosa de que o acesso ao mundo, ao conhecimento, à troca de culturas, à experiência do outro, é um luxo. E isso é o mais triste. Deixa o mundo menor para quem habita nele. Uma ideia que dialoga diretamente com um Brasil cada vez mais dividido entre quem pode circular e quem precisa apenas assistir.

Fica a pergunta que precisa ecoar: até quando o mundo será organizado com base em barreiras invisíveis, mas profundamente sentidas por quem sonha? O visto americano, com esse novo preço, deixa de ser apenas um documento burocrático e se torna um símbolo de exclusão. E, infelizmente, para boa parte dos brasileiros, o “grande e belo” projeto de lei sancionado por Trump tem tudo, menos beleza para os brasileiros.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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