No caso de Robinho, a sucessão de recursos e a estratégia defensiva ainda funcionam como anestesia social
A trajetória de Robinho, outrora celebrado em estádios, hoje se converte em um retrato sombrio de como a Justiça pode se tornar refém do próprio tempo. Condenado em todas as instâncias na Itália por estupro coletivo, transitado em julgado em 2022, o jogador só começou a cumprir pena no Brasil em 2024, depois de um intervalo que não foi meramente processual, mas simbólico: dois anos em que a realidade da condenação parecia suspensa, como se o peso da lei pudesse ser calibrado pela notoriedade de quem andava de patinete e tirava fotos normalmente no litoral santista.
Os trâmites jurídicos, evidentemente, exigem rigor e garantias. Mas no caso de Robinho, a sucessão de recursos e a estratégia defensiva ainda funcionam como anestesia social: atrasaram a materialização da sentença, diluíram a gravidade do crime e criaram a falsa impressão de que havia ainda espaço para dúvida. O tempo, usado como manobra, não serviu ao devido processo legal, mas à postergação da responsabilidade. E quando o relógio da Justiça anda devagar demais, ele não é apenas lento: ele se torna cúmplice.
Esse compasso desigual contrasta com a realidade de milhares de réus anônimos, que cumprem penas sem a possibilidade de arrastar debates até o Supremo Tribunal Federal. O contraste é incômodo, porque denuncia que a lei, em sua aplicação prática, não é tão igualitária quanto reza a Constituição. A seletividade aqui tem nome, rosto e carreira futebolística.
A prisão de Robinho, tardia, parece corrigir um descompasso, mas não apaga a sensação de que o tempo serviu de escudo para a impunidade provisória, e que agora paira sobre o STF. Se a Justiça tem por dever não apenas punir, mas também afirmar valores coletivos, o caso Robinho escancara a urgência de se pensar o tempo como parte essencial dessa equação. Justiça tardia pode até ser Justiça, mas é sempre uma Justiça enfraquecida. E nesse enfraquecimento, quem vence não é a lei nem a sociedade, mas o silêncio da vítima, deixado à mercê de um calendário que não lhe devolve o que perdeu.
