Em busca de sinais num mundo sem garantias

Astrologia, tarô e rituais religiosos seguem em alta, não por modismo, mas porque oferecem conforto em tempos de instabilidade

Nunca se acreditou tanto em Mercúrio retrógrado como em épocas de eleição, crises climáticas e boletos vencendo. A astrologia, o tarô, os cristais e os banhos energéticos não são meros adereços do esoterismo pop, são respostas psíquicas a uma era marcada pela ansiedade. Pelo menos, comigo. Quando tudo parece escapar do controle, buscamos nas estrelas, nas cartas ou nos búzios uma chance de organizar o caos. E, curiosamente, tem funcionado.

Basta abrir o Google Trends: as buscas por “mapa astral”, “tarô online” e “rituais de proteção” disparam em momentos de instabilidade global, como agora. Livros astrológicos, religiosos e exotéricos voltaram às listas de mais vendidos. No TikTok, alguns perfis estão com mais 40 bilhões de visualizações, marcando uma avalanche de conteúdos onde jovens explicam casas astrológicas, tiram cartas para o dia e ensinam a energizar a água com intenções. Uma sobrevivência simbólica linda, na minha opinião.

Estamos lidando com um mundo que exige decisões imediatas, discursos prontos, produtividade em alta performance e uma presença digital constante. Nesse contexto, o misticismo oferece algo raro: pausa, escuta, reflexão. Você não precisa “acertar tudo” quando está em conexão com algo maior. Pode apenas interpretar. Ou sentir. O tarô não responde, ele propõe. E isso, em tempos tão agressivamente objetivos, é revolucionário.

Também há um movimento silencioso de volta ao ritual: o banho de ervas substitui a pressa do banho cronometrado; a vela acesa à noite simboliza um desejo num mundo que só fala de metas em lâmpadas de lead. Essa espiritualidade popular não se opõe à ciência, não é nada disso, ela atua onde a ciência não dá conta: no campo das angústias que não têm nome, dos lutos que não foram vividos, das perguntas que nenhuma terapia breve responde.

No fim, ninguém quer prever o futuro. O que todos buscam, com uma carta de tarô na mão ou um cristal no bolso, é a chance de atravessar o presente com um pouco mais de sentido. Num mundo onde quase tudo escapa das nossas mãos, qualquer sinal que nos devolva a sensação de pertencimento ao tempo, ao corpo, ao mistério, vira bálsamo. E talvez não haja nada mais moderno do que isso. Amanhã, inclusive. vou para o trabalho com uma fita adesiva no umbigo. Será que funciona?

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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