Congresso Nacional acaba de sepultar a igualdade entre brasileiros. Rasgou-se, também, a Constituição

A aprovação da PEC da blindagem consagra a diferença entre políticos e cidadãos e entra para a história como maior aliada da corrupção brasileira, que será aloprada, sem cerimônia, a partir de AGORA!

Foi só Flavio Dino solicitar à PF investigações sobre as emendas Pix, que ‘tchum’: aprovado a PEC da blindagem. Isso é histórico: o Congresso Nacional riscou da Constituição uma das cláusulas mais caras ao Estado democrático de direito: a de que todos são iguais perante a lei. A partir de agora, não somos mais uma República que se assenta na igualdade jurídica, mas um país em que a elite política se atribui privilégios inalcançáveis ao cidadão comum. Enquanto o brasileiro de rua responde por seus atos sem a possibilidade de escolher se será investigado ou não, o parlamentar passa a dispor do poder de decidir, em última instância, sobre a própria sorte diante da Justiça.

A teoria democrática sempre se sustentou na simetria fundamental entre governantes e governados. John Locke afirmava que o contrato social não se legitima se não houver a submissão de todos às mesmas regras. Rousseau lembrava que a lei só é justa quando se aplica indistintamente a quem a cria e a quem a cumpre. O Congresso brasileiro, ao aprovar a PEC da blindagem, subverteu esse princípio elementar, erguendo um muro jurídico que transforma o político em uma espécie de “cidadão de exceção”. É a ruptura silenciosa com o pacto democrático.

O cidadão comum, hoje, está submetido ao braço inexorável da lei. Um deslize, um crime, e não há como evitar o processo ou a investigação. Já o político, sob a nova ordem inaugurada pela PEC, pode decidir se autoriza ou não que o Estado investigue sua conduta. O resultado é um abismo moral e institucional que corrói o fundamento da República: o povo se torna governado por uma casta imune, uma aristocracia legislativa que, diferentemente das antigas monarquias, não se legitima pelo direito divino, mas pelo cinismo legalista.

Não se trata apenas de mais uma manobra regimental ou de um arranjo para autopreservação. Trata-se de um gesto de degradação institucional sem paralelo em nossa história recente. Ao blindar-se contra a Justiça, o Congresso não apenas rompe com a tradição republicana, mas assume seu papel como o pior Congresso da história do Brasil, não por ausência de escândalos anteriores, mas porque elevou à norma constitucional o privilégio de não ser igual ao povo que diz representar.

A PEC da blindagem marca um divisor de águas. O Legislativo, que deveria ser a casa do povo, transformou-se um refúgio corporativo onde leis são produzidas para proteger quem deveria ser o primeiro a cumpri-las. Agora ser corrupto e querer ser político é legítima defesa. Não somos mais iguais. Somos, agora, testemunhas de uma democracia mutilada, em que a cidadania é reduzida a uma ilusão e a lei passa a ser, definitivamente, um instrumento seletivo. O Congresso assinou hoje sua sentença histórica: ser lembrado não como guardião da República, mas como o coveiro da igualdade.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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