Se Juliana Marins “assumiu o risco” ao viver sua paixão pela natureza, seu pai teria assumido o risco de um câncer quando transformou uísque em rotina? A frieza foi seletiva. Diferente de você, eu lamento e torço demais pelo seu pai.
Causou indignação a publicação de um dos filhos da atriz Malu Mader e do músico Tony Bellotto, fria e indiretamente sobre a morte de Juliana Marins, brasileira que perdeu a vida de forma trágica em um vulcão na Ásia. Segundo ele, não há por que lamentar, já que Juliana “assumiu o risco”. A fala, além de desumana, revela uma soberba incompatível com qualquer traço de empatia ou maturidade. Pois bem: se é para falar de riscos, então vamos falar seriamente sobre riscos, MAS TODOS ELES!
O pai do autor dessa opinião impiedosa deu, certa vez, uma entrevista lembrando seus tempos de excesso: disse que, nos anos áureos, tomava uísque como quem toma café. Uma garrafa era rotina. Essa mesma rotina, segundo os próprios relatos, deixou marcas profundas em sua saúde. Hoje, Tony Bellotto enfrenta um câncer no pâncreas, um dos mais letais e difíceis de tratar. Ninguém em sã consciência desejaria algo ruim a ele. Mas se seguirmos a lógica gélida do filho, teríamos que simplesmente cruzar os braços e dizer: ele também assumiu os riscos. Não é? Pelo seu pai, você lamenta?
O problema de discursos como o desse rapaz não é apenas a frieza: é a total incapacidade de se colocar no lugar do outro. Quem fala da morte de uma mulher como quem comenta um lance de futebol, desprovido de emoção, ignora que a vida é feita de escolhas e riscos o tempo todo. Juliana amava a natureza, a liberdade, as viagens. Viver intensamente não é um erro: é uma escolha legítima. Assim como foi uma escolha viver de excessos nos anos 80 e 90, em festas regadas a álcool, cigarro e muitas, MUITAS DROGAS! A diferença é que, para algumas pessoas, a empatia parece ser um privilégio que se reserva apenas à própria família.
Será que, ao ver o pai em tratamento, lidando com uma doença tão dura, esse jovem teria coragem de escutar alguém dizer: “Não tenho pena. Ele sabia dos riscos”? Provavelmente não. Sentiria dor, revolta, injustiça. Pois é exatamente isso que muitos sentiram ao ler seu comentário sobre Juliana Marins. Não se trata de pedir que ele chore, mas que respeite. Que entenda que a empatia não é um favor: é o mínimo.
Se falta maturidade para compreender isso, que ao menos reste a vergonha. Porque a internet até esquece, mas o tempo cobra. E talvez, um dia, quando os papéis se inverterem, como inevitavelmente se invertem, ele perceba que não há escudo mais frágil do que o da arrogância revestida de racionalidade. E que, diante da morte, o que se espera de qualquer ser humano é, no mínimo, lamento e respeito.
