Adultos de chupeta: o novo ridículo social

A necessidade de regredir para a infantilização tem um motivo: Freud explica…

Há quem diga que vivemos uma era de liberdade sem limites. Eu diria que, às vezes, ela vem com bico de silicone. Sim, você leu certo: a nova tendência entre alguns adultos é desfilar por aí com chupeta. Como se o boom dos bebês reborn, aquelas bonecas hiper-realistas que já assustavam pela proximidade com a realidade, não fosse suficiente, agora temos a versão “faça você mesmo”: pessoas que decidiram ser os próprios bebês vivos. É o berçário do Instagram, onde a fralda é mental, mas a chupeta é real.

Na psicanálise, esse fenômeno conversa com a ideia de regressão: um mecanismo de defesa em que o indivíduo retorna, simbolicamente, a fases mais primitivas da vida para lidar com ansiedades ou frustrações atuais. É como se a mente dissesse: “O mundo está pesado demais, deixa eu voltar para quando minha maior preocupação era não deixar cair a mamadeira”. O problema é que, quando esse retorno deixa de ser simbólico e vira prática cotidiana, podemos estar diante de algo mais sério: uma dificuldade de enfrentar as responsabilidades da vida adulta e um desejo de se refugiar no colo da fantasia.

Claro, nem todo uso de chupeta na vida adulta precisa ser diagnóstico clínico. Há quem o faça como performance, fetiche ou simples brincadeira estética. Mas o que chama atenção é o crescimento desse movimento como estilo de vida, amplificado por redes sociais e comunidades virtuais que validam e reforçam a prática. A internet, como boa babá digital, oferece aplausos instantâneos, que funcionam como uma espécie de leite morno emocional para quem busca acolhimento.

O humor aqui é inevitável, mas o pano de fundo é um sintoma cultural: vivemos uma infantilização prolongada, onde o amadurecimento é constantemente adiado. Entre boletos, crises econômicas e ansiedades existenciais, ser adulto parece cada vez menos atraente. A chupeta, nesse cenário, vira símbolo e protesto: um “não quero crescer” dito com acessórios de bebê, mas também um grito por cuidado e afeto num mundo que se mostra cada vez mais impessoal e competitivo.

A questão que fica é: estamos diante de um modismo passageiro ou de um retrato fiel da nossa era emocionalmente esgotada? A psicanálise nos lembra que todos carregamos uma criança interior, mas talvez ela não precise de um enxoval inteiro para existir. Afinal, amadurecer não é matar o bebê que fomos, mas integrá-lo à vida adulta de modo que possamos caminhar… sem precisar engatinhar para sempre. E sem chupetas.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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