A “investigação pessoal” que acabou revelando mais sobre o investigador do que sobre “os investigados”
A moralidade de certos púlpitos brasileiros parece ter a consistência de um salto alto com uma perninha de cisne, uma boa barriga de chope e uma calcinha azul. O caso mais recente envolve um pastor que, em plena calada da noite, foi flagrado no que podemos chamar de um ensaio performático: vestido de mulher, de calcinha, depilado como se fosse protagonista de desfile, andando no meio da rua à espera de um carro. A cena, digna de um teatro experimental mal financiado, só não foi mais constrangedora que a justificativa que veio depois. Ao lado da esposa, com a entonação de quem lia um boletim meteorológico, o reverendo explicou que estava em “uma investigação pessoal, por motivos pessoais”.
Ah, a frase! É poesia pós-moderna involuntária. “Investigação pessoal, por motivos pessoais” deveria virar lema em camisetas, adesivos de carro e bio de rede social. É o tipo de sentença que não explica absolutamente nada, mas que, dita com suficiente convicção, dá a impressão de que há um enredo complexo nos bastidores. Só que o único enredo evidente é aquele que expõe a distância quilométrica entre a retórica pública e a vida privada desses moralistas de microfone. A Bíblia que eles brandem aos gritos perde completamente o brilho quando a prática é mais “50 Tons de Cinza” do que “Sermão da Montanha”. A cena era típica de quem marcou a realização daquele fetiche pela internet, mas o parceiro virtual só apareceu para gravar e expor o ridículo.
Não é novidade que esses embaixadores da santidade são, muitas vezes, embaixadores apenas de si mesmos. Vendem-se como guardiões da pureza e da família tradicional, mas vivem um tipo de vida secreta que daria inveja a roteiristas de novela das onze. A diferença é que, nas novelas, o figurino é de propósito. No caso do pastor, o figurino era, segundo ele, parte de uma missão investigativa. Quem sabe não estava estudando a teologia da microfibra ou testando a resistência moral de uma saia lápis?
O mais curioso é que, em meio ao vexame, ainda tentam vestir o episódio com a roupagem da nobreza espiritual. Como se a rua escura, o salto baixo e a depilação impecável fossem, na verdade, ferramentas evangelísticas disfarçadas. A plateia que um dia se emocionou com suas palavras agora só consegue lembrar da “investigação” e de que talvez o verdadeiro campo de batalha moral esteja muito mais no espelho do banheiro do que no altar da igreja.
Enquanto isso, seguimos colecionando histórias de pastores, líderes e gurus que, sob o manto da santidade, escondem o mais humano dos infernos: a incapacidade de viver aquilo que pregam. A cada “investigação pessoal” dessas, por “motivos pessoais”, o púlpito brasileiro perde um pouco mais de credibilidade e nós, espectadores, ganhamos mais um capítulo para a antologia da hipocrisia nacional. Oremos, porque rir já estamos rindo.
