A sabedoria do espírito em tempos de excesso

Práticas espirituais seguem com demanda cada vez mais alta porque oferecem escuta, sentido e presença, exatamente o que falta em uma era dominada pela urgência e pela insegurança

Num tempo em que tudo precisa ter utilidade, resposta rápida e comprovação imediata, cresce silenciosamente o apreço por algo mais antigo, mais profundo e, talvez por isso mesmo, mais necessário: espiritualidade. Ele está em todas as religiões. O campo teológico é imenso. Ferramentas que jamais saíram de moda, porque nunca se prestaram à moda. Elas resistem porque não prometem atalho, prometem escuta. E, hoje, isso vale mais do que previsão.

Não é coincidência que em meio a diversos colapsos que assistimos, à precarização das relações, à medicalização da tristeza e ao cansaço mental crônico, tanta gente volte o olhar para práticas que lidam com o invisível. São caminhos que não negam a dor do mundo, mas a integram em uma leitura mais ampla da existência. Quem lê um mapa astral com seriedade, quem abre um oráculo com devoção, quem conversa com uma entidade para um bem comum, está acolhendo o outro em sua humanidade desorganizada.

O que para alguns pode parecer estudo e, para outros, superstição, é, na verdade, uma forma ancestral de organizar o mundo interior. Em vez de se colocar contra a ciência ou o racional, essas práticas caminham ao lado da poesia, da mitologia e da psicologia profunda. Jung sabia. Clarissa Pinkola Estés também. E hoje, cada vez mais terapeutas reconhecem o valor terapêutico do espiritual, do arquétipo, do silêncio que antecede a palavra.

O aumento das buscas por espiritualidade não é fuga, é tentativa de permanência. Os livros sobre astrologia, espiritualidade e saúde mental se multiplicam, os cursos têm fila de espera, as feiras místicas recebem jovens com fome de sentido. Há algo bonito e potente em ver uma geração tão conectada à tecnologia desejar, com a mesma intensidade, acender uma vela, preparar um banho ou consultar um pai de santo ou um pastor. Dependendo do pastor, claro! É um gesto de resistência íntima, um pedido de pausa.

O mundo está acelerado demais, raso demais, barulhento demais. E é por isso que cresce, e seguirá crescendo, o respeito por quem se dedica, com seriedade e afeto, ao trabalho físico e espiritual. os dois campos não vendem respostas prontas. Mas, pelo menos, devolvem às perguntas a dignidade do tempo com a paciência da espera. E talvez por isso sigam sendo tão procuradas: porque, no fundo, todo mundo sabe que, sem simbolismo, a vida não se sustenta.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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