Parecido com o Brasil, cresce a “religião nacionalista” na Índia. Novo “hinduísmo nacionalista” entra na política oprimindo minorias e gerando onda de protestos no país
No tabuleiro geopolítico contemporâneo, uma peça tem ganhado força com roupagem sagrada: a religião transformada em ideologia de Estado. Na Índia de Narendra Modi, o “hinduísmo nacionalista”, promovido pelo partido Bharatiya Janata Party (BJP), tornou-se mais que uma crença: virou plataforma de governo. A ascensão da ideologia Hindutva redefiniu o nacionalismo indiano com base étnico-religiosa, gerando políticas de exclusão sistemática contra muçulmanos, cristãos e outras minorias. A ciência política internacional já alerta para os riscos dessa fusão entre religião e nacionalismo, onde o culto à divindade passa a ser também um culto à exclusão.
No Brasil, o fenômeno encontra eco no “cristianismo bolsonarista”, que promoveu uma espécie de cruzada política contra qualquer desvio da moral conservadora. Inspirado não em princípios cristãos universais, mas em uma leitura bélica e seletiva do evangelho, o bolsonarismo fez do púlpito uma extensão do palanque. Ao colocar evangélicos e católicos conservadores como fiadores da “família tradicional” e do “cidadão de bem”, criou-se um ambiente fértil para a perseguição a minorias sexuais, religiosas e raciais, que viram sua existência questionada como se fossem ameaça à ordem divina e nacional.
O paralelo entre Índia e Brasil vai além. Lendo sobre o assunto em alguns sites e assistindo dois vídeos no Youtube, deu pra traçar claros paralelos entre nosso País e a Índia. Ambos os casos exemplificam o que vou chamar de “religião civil autoritária”, um fenômeno em que a fé não apenas legitima o poder, mas o santifica, blindando seus líderes de críticas e convertendo o contraditório em heresia. Essa simbiose entre religião e governo mina os pilares do pluralismo democrático e transforma o Estado em extensão de uma igreja militante. Nas urnas, a identidade religiosa é manipulada como voto de fé; nas ruas, ela serve como licença para o ódio.
É preciso lembrar que a laicidade não é hostilidade à religião, mas um antídoto contra o absolutismo. Quando o Estado se curva a uma fé específica, ele não apenas viola direitos: ele rompe o pacto democrático. Tanto na Índia quanto no Brasil, a política que se instalou com peso religioso absurdo (observe a nomenclatura: ‘bancada evangélica’) não protege valores espirituais, apenas instrumentaliza a fé para manter estruturas de dominação. O que está em jogo não é Deus, mas o poder de falar em seu nome, expulsando do templo cívico aqueles que não seguem a cartilha dos “escolhidos”.
Em tempos de radicalização identitária e discursos de pureza moral, é urgente recuperar o princípio republicano de neutralidade estatal. O mundo já conheceu as consequências de Estados teocráticos e de regimes que se esconderam atrás de altares. O desafio contemporâneo é garantir que a fé não seja usada como faca, seja ela hindu, cristã, evangélica, ou qualquer outra. O perigo não está em Deus, mas nos homens que o invocam para justificar o inaceitável. Suas únicas crenças.
