Por que o jornalismo de celebridades é o mais consumido do mundo

Longe da superficialidade, esse segmento traduz o inconsciente coletivo, espelha desejos e revela verdades que muitos preferem ignorar.

Em um mundo cada vez mais saturado por informações, o jornalismo de celebridades segue como um dos gêneros mais consumidos e debatidos dentro e fora das redações. Para muitos, esse consumo parece fútil ou escapista, mas essa leitura revela mais sobre o preconceito contra determinados temas do que sobre sua real importância. Na prática, o jornalismo de celebridades não apenas informa: ele traduz, em linguagem simbólica, os afetos, as projeções e os desejos mais profundos da sociedade.

A psicanálise, especialmente a partir de Freud e Lacan, nos ajuda a compreender por que esse tipo de conteúdo é tão irresistível. O ser humano, por estrutura, é um sujeito da falta, está sempre desejando algo que lhe escapa. As celebridades, nesse cenário, aparecem como figuras onde o desejo se concentra: elas representam o sucesso, a perda, o amor idealizado, a traição, a separação, a beleza, as mudanças estéticas, o reconhecimento. O jornalismo que cobre suas trajetórias, conflitos e glórias não apenas relata fatos: ele organiza o imaginário social.

Engana-se quem pensa que se trata apenas de fofoca ou entretenimento raso. Um divórcio de famosos, por exemplo, pode servir como pano de fundo para debater questões como a fidelidade, a autonomia feminina, a saúde mental ou as dinâmicas familiares contemporâneas. O jornalista de celebridades precisa ser, ao mesmo tempo, analista do comportamento, curador de narrativas e, muitas vezes, porta-voz das inquietações do público. Há técnica, sensibilidade e ética envolvidas nesse ofício, como em qualquer outra editoria. E quando o debate se levanta: na mosca, a discussão está em pauta fora da redação, missão cumprida!

A grandeza do jornalismo de celebridades está justamente em sua capacidade de conectar o macro ao micro, o íntimo ao coletivo. Quando alguém acompanha a ascensão de uma atriz, a crise de um cantor ou o luto de um atleta, não está apenas observando: está participando de uma dramaturgia real, que envolve identificação, catarse, espelhamento e, muitas vezes, cura. Há uma dimensão emocional e simbólica nesse consumo que outras editorias raramente conseguem ativar com a mesma intensidade.

Por isso, é hora de reconhecer o valor do jornalismo de celebridades com a seriedade que ele merece. Mais do que um produto de entretenimento, trata-se de uma lente legítima sobre o mundo e sobre nós mesmos. Em tempos de tanta desinformação e distanciamento emocional, talvez seja justamente esse tipo de jornalismo que tem falado com escuta, e o desejo e traduz o inconsciente social, que mais se conecta com o que somos de verdade. Essa é nossa missão.

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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