A infância como território de esperança

Após ficar um pouquinho no telefone com minha filha, permaneço com a mesma conclusão: preservar o olhar das crianças é resistir ao cinismo do mundo

Em meio a um cenário global marcado por conflitos, guerras e uma avalanche de notícias que testam diariamente nossa capacidade de manter a serenidade, há um ponto de luz que insiste em resistir: a infância. O olhar de uma criança, ainda desprovido de cinismo e carregado de curiosidade, nos recorda que a humanidade tem sempre a chance de recomeçar. É nesse território delicado, onde a inocência convive com a descoberta, que se planta a semente de um futuro menos brutal e mais compassivo.

O problema é que esse território tem sido frequentemente ameaçado. Crianças que deveriam estar na escola estão em campos de refugiados; meninos e meninas que deveriam brincar encontram-se cercados por sirenes, escombros e notícias de ódio. A infância roubada é um dos sintomas mais cruéis das crises do nosso tempo, porque significa negar a possibilidade de um amanhã diferente. Cada vez que a guerra invade a vida de uma criança, não se destrói apenas uma biografia, mas uma fatia do futuro coletivo.

É por isso que proteger a infância não pode ser visto como um gesto ingênuo ou meramente afetivo: trata-se de uma necessidade civilizatória. Investir em educação, cultura, saúde e segurança infantil é mais do que uma política pública: é um compromisso ético. É reconhecer que o mundo de amanhã será tão humano quanto a capacidade de hoje de garantir que nossas crianças cresçam com a liberdade de sonhar.

Assim que eu terminei de falar Valentina, descobri o quanto o tempo nos endureceu. Perceber o brilho no olhar infantil diante de coisas simples, como ir ao cinema com as amigas com a fantasia dos personagens, uma folha caindo, um cachorro correndo, uma estrela no céu, tudo isso é perceber o quanto esquecemos de admirar. E talvez seja aí que a infância nos educa: não apenas no futuro, mas no presente, lembrando-nos de que o essencial não precisa de guerras, nem de conquistas de poder, mas de cuidado e ternura.

Em última análise, defender a infância é defender a esperança. Quando cuidamos das crianças, estamos cuidando de nós mesmos, do que ainda temos de mais puro e do que podemos oferecer de mais verdadeiro ao mundo. Preservar o olhar das crianças é, portanto, uma forma de resistir ao cinismo que nos rodeia. Porque, se o presente parece turvo, é na infância que mora o farol que ainda pode iluminar o caminho. Não por acaso Jesus avisava: “é delas o Reino dos Céus”

Alessandro Lo-Bianco

Fui repórter da Editora Abril, O Dia, Jornal O Globo, Rádio CBN e produtor executivo dos telejornais da Record. Estou ao vivo na RedeTV!, como colunista de TV do programa “A Tarde é Sua”, com Sônia Abrão. Também sou colunista do portal IG (lobianco.ig.com.br). Tenho 11 livros publicados e 17 prêmios de Jornalismo.

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